Porque a Travessia da Serra Fina é a mais difícil do Brasil?
Sempre fui alimentado por desafios, mas nem de longe imaginava o quanto de fato ela é difícil.
Por Jorge Afonso
Todo grupo a caminho do Pico dos Três estados
Em 2015 então decidi que faria a famosa travessia da Serra Fina. Logo comecei a pesquisar tudo que envolvia essa saga. Sites, canais no YouTube etc. Todos concordavam em um ponto, o treinamento é primordial. No currículo era preciso tem algumas travessias consideráveis com dificuldades que lembrassem as que eu veria na Serra Fina. Então comecei a treinar. Estava bem acima do peso, foi preciso até passar com nutricionista. Foi um período de mudanças, pois tinha na mente que deveria carregar muito peso durante a travessia principalmente água e então com o peso que eu estava dificultaria é muito. É então lá se foi 20kg, exatamente os mesmos da minha cargueira já com a água. Lembrando que na Serra Fina não tem pontos de água depois do Capim Amarelo. Então levei 2 litros de cada lado.
O primeiro passo durante a perca de peso foi definir uma data para realizar esse grande Projeto. Dia 23 de Abril de 2016, fecho então a data com Willian, Guia em Passa Quatro – MG. Todos os colegas em Trilha eram unânimes, Willian é um dos melhores quando o assunto é Serra Fina! Pude perceber de perto todos os bons comentários. Do começo ao fim, mandou bem demais.
Mas, antes de iniciar a travessia ainda penei para atingir o peso esperado e comprar todos os equipamentos necessários. Aqui cabe observação. Infelizmente aqui no Brasil devido à falta de concorrência no meu ponto de vista, não temos muitas empresas que vendem equipamentos de trekking, e então acabamos comprando algo mais acessível. Foi o que eu fiz. Comprei uma cargueira da Mormaii que não tinha aquele suporte na cintura, isso faz uma falta tremenda na distribuição do peso da Cargueira. Sem este suporte o peso fica todo sobre os Ombros, causando dores intermináveis, afetando inclusive a coluna. Levando em conta que são 4 dias, a dor era insuportável. Portanto, Mochila cargueira é investimento. Sua coluna agradece. Como se não bastasse, comprei também aquela barraca de praia da Mormaii. A barraca é boa, mas o nome já diz é para praia (risos). Eu fiz uma escolha errada e paguei o preço. Contarei mais para frente.
Mochila equipada, chega o dia tão sonhado. Partimos para Minas Gerais, Passa Quatro. Já na pousada tenho tempo de descansar algumas horas pois sairíamos as 03h da manhã para iniciar o primeiro dia. Logo de cara já sinto as costas doerem muito. Lembram o que falei da mochila, pois bem, não cometam o mesmo erro que eu, pesquisei muito sobre a travessia e não foquei também nos equipamentos.
Apesar das dores o cenário é de tirar o fôlego, montanhas e montanhas a nossa frente e um caminho bem curto na Serra, por isso o nome Serra Fina, por ser um caminho de uns 40 centímetros e em muitos pontos, penhascos dos dois lados. Paramos muitas vezes para pegar um folego, ou até mesmo para tentar registrar através de fotos a beleza dessas montanhas. Mas, confesso, não consegui passar para imagem o quanto é bonito. Vá la e veja com seus próprios olhos, é surreal.
Ao chegarmos no Maracanãzinho montamos acampamento. Lembram que comentei da barraca que comprei da Mormaii? Pois é, aqui tive a pior experiência em acampamento. Lhes conto. A barraca de praia, o nome já diz tudo, é para praia. Ao anoitecer, por estamos em alta montanha, logo caiu a temperatura, e subiu o sereno. Em algumas coisas, todo sereno condensou e lá estava dentro da barraca. Mesmo eu cobrindo a cabeça com a touco, não foi o suficiente e molhou minha cabeça assim como também meus pés com a água que descia pelas paredes da barraca. Se não me engano, fazer 1º naquela noite, eu batia os dentes de frio e torcia para amanhecer logo.
Pela manhã, eu fui o primeiro a desmontar a barraca para partimos, como estava com muito frio não quis tirar a camisa segunda pele e nem a calça segunda pele, no primeiro quilometro eu já estava suando, mas mesmo assim não tirei e paguei um preço caro por isso. Ao chegarmos na base do Pico da Mina senti a fraqueza por uma noite que não dormi e por manter uma roupa não recomendada para caminhada em um sol de quase 40º. As pessoas foram passando por mim na trilha, até eu ficar por último. Assim fiquei preocupado, parando muito a água já acabando e não estava nem na metade ainda do Pico da Pedra Mina. Por diversas vezes ouvia a Mara, o Leo a Vanessa gritando “Vamos, você consegue! Boraaa falta pouco. ”. Isso me fortalecia até o passo seguinte. Mas desistir nunca foi opção para mim. E de passo em passo eu seguia em frente.
Ao chegar no topo do Pico da Pedra Mina recebi abraços e aplausos, parecia final do campeonato paulista Corinthians ganhando nos pênaltis, sim consegui chegar. Estava morto de cansaço. Poderia facilmente dormir ali mesmo por horas.
A Pedra da Mina, 2.798 m
A Pedra da Mina, ou ocasionalmente o pico da Pedra da Mina, é oficialmente a quarta montanha mais alta do Brasil, com 2798 metros de altitude. Localiza-se na serra Fina, uma seção da serra da Mantiqueira, por sua vez uma das cadeias de montanhas mais importantes do país. Altitude: 2.798 m
Mas era preciso continuar. No Pico da Pedra da Mina não tinha espaço para montar as barracas, ainda mais por ser feriado. Impossível. Seguimos adiante para o Vale do Ruah, lá conseguimos acampar, confesso que não estava afim de comemorar, apenas montei bem rápido o acampamento e fui deitar. A galera toda chamando para um rango comunitário. Mas eu não tinha nenhuma força. Precisava dormir. E assim fiz. Após duas horas, voltaram a me chamar, e então consegui levantar fazer meu rango e participar da reunião. Reunião está para avisar que quem desejasse desistir, essa era a hora. Pois dali em diante as dificuldades aumentariam. Eu estava podre, não aguentava nem mais 100 metros. Mas na minha mente não existia a palavra desistir. Algumas pessoas se davam como satisfeitas até aquele ponto, ao ponto de desistir. E assim, apenas um casal optou por desistir devido as fortes dores e câimbras, desceram então pelo Paiolinho. E nós levantamos acampamento a 00h00 e saímos as 02h pelo vale do Ruah. Lembro-me bem da altura do Capim, das rochas que não vi e batia com forma minha caneca, tropeçávamos muito um no outro, porque alguns de nós não levaram lanterna, então ali anoite era um tombo atrás do outro.
Já amanhecendo, focávamos no Pico dos Três estados umas das últimas conquistas até finalizarmos a travessia. E de fato, ao chegarmos podemos constatar a beleza do lugar, é incrível.
pico dos Três Estados, 2665 m
O pico dos Três Estados é uma montanha em cujo topo está o ponto onde se encontram as divisas geográficas dos estados brasileiros de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Suas coordenadas são: 22º 25′ 24″S e 44º 48′ 48″ W. Possui a altitude de 2665 m e encontra-se localizado na extremidade oriental da serra Fina, uma seção da serra da Mantiqueira, próximo à Pedra da Mina e ao pico das Agulhas Negras. O ponto tríplice das divisas é marcado no cume por um pequeno tripé de ferro lavrado com os nomes dos três estados, nas respectivas direções.
Já andando agora no primeiro pelotão, sempre tinha tempo para descansar ao esperar o grupo se reunir novamente para prosseguirmos pela trilha. Já exaustos escutamos do guia, “Falta 20 minutos, esta perto.” E já se passava horas. E para incentivarmos um ao outro começamos a falar de comido, o que cada um comeria ao chegar na cidade de Passa quatro ao retornar da travessia. Pizza, Sanduiche, um bom prato de arroz e Feijão, cada um tinha seu desejo forte na mente, nos impulsionando para frente.
Ao avistarmos o sítio do Pierre a emoção tomava conta, finalmente acaba ali a tão temida Travessia da Serra Fina. Um abraçando o outro, comemorando esse grande feito.
Que privilégio participar dessa conquista, desse grupo, dessa Serra Fina.
Galera Top
Que privilégio participar dessa conquista, desse grupo, dessa Serra Fina.
NIVEL – HARD² | Total percorrido – 33,64 km
Serra Fina é uma das trilhas mais obcecadas por quem está no mundo outdoor. Considerado um circuito clássico do Brasil, é realmente difícil, intenso e majestoso ao mesmo tempo. A experiência e o condicionamento físico são primordiais… Mas a Serra Fina nos ensina o autoconhecimento, a descoberta dos seus próprios limites e a capacidade de ir muito mais longe do que imaginava ser capaz. O grau de dificuldade é “Hard”, exige grande esforço físico com subidas em todos os dias compensando com um visual de tirar o folego. Esse trekking possui mais de 33,64km de extensão no qual fizemos em 4 dias partindo da Toca do Lobo (Passa Quatro – MG) finalizando em Sítio do Pierre (Itamonte – MG).
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Localização: Serra da Mantiqueira na cidade de Passa Quatro – MG
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